terça-feira, 22 de abril de 2008

O Deus de todos os nomes e o diálogo inter-religioso (I)



Michel Amaladoss



Um outro mundo é possível. Mas só é possível através de uma transformação deste mundo. Tal transformação implica a libertação integral dos seres humanos e do mundo, a qual não pode acontecer sem transformação nos campos das culturas e religiões. 

Mas a transformação das religiões é complexa. As religiões tendem a ser tanto legitimadoras quanto proféticas. em sua tentativa de tornar-se relevantes para uma situação particular. as religiões contextualizam-se em termos sociais e políticos. Elas justificam estruturas econômicas e sócio-políticas existentes. O sistema de castas na Índia, a escravidão e o aparthaid, bom como desigualdades socioeconômicas, têm sido justificadas dessa maneira. Ao mesmo tempo, em nome de valores mais profundos ou do Transcendente que testemunham, elas também desafiam ou contestam as pessoas, suas condições de vida e estrutura para que mudem.

Nesse sentido, toda religião tem características tanto opressoras quanto libertadoras. Elas podem estar representadas por grupos diferentes dentro delas. As intituições tendem a ser conservadoras, ao passo que pessoas e movimentos carismáticos tendem a ser proféticos. As dimensões proféticas e libertadoras das religiões procuram refazer o mundo. São animadas pela esperança. Elas não só afirmam que um novo mundo é possível, mas pretendem oferecer formas para alcançá-lo. O hinduísmo busca liberdade do fardo do ciclo de nascimentos neste mundo promovendo a ação justa sem apego. O budismo procura transcender uma vida de sofrimento extirpando o desejo ou o apego. O cristianismo busca a libertação do pecado e de suas estruturas opressoras pelo amor e serviço desinteressado para com os outros. O islamismo visa a promover a justiça e a comunidade universal pela obediência à lei de Deus.

Poder-se-ia pensar que essas religiões podem colaborar naq libertação das pessoas de seus sofrimentos neste mundo e na introdução de um mundo novo. Porém, se lançar-mos um olhar sobre o mundo, veremos que as religiões, na verdade, parecem fazer parte do problema. Focos de tensão como o Iraque, a Palestina, a Bósnia, a Irlanda do Norte, o Sudão, a Caxemira, as Filipinas, a In donésia e até a Tailândia apontam para tensões inter-religiosas subjacentes, que criam uma atmosfera de temor autodefensivo.

O pluralismo religioso, portanto, não é meramente um fato, mas um problema. Para as religiões metacósmicas, ele não é simplesmente um problema social e político; é também um problema religioso, se elas se concebem como a única religião verdadeira. Entre os cristãos, entretanto, tem havido uma avaliação cada vez mais positiva de outras religiões e um desejo de dialigar e colaborar com elas na construção de um mundo novo.

Essa nova perspectiva teológica ainda não conseguiu ampla aceitação, ao menos em círculos oficiais, e ainda necessita ser explicada e defendida. Mas ela é crucial para quaisquer esforços que pretendam construir um mundo novo. Eu proporia que todas as religiões precisam desenvolver tal perspectiva positiva para com outras religiões. Antes de esboçar essa nova teologia, vamos examinar, mais atentamente, a situação que a fez surgir. Afinal, toda teologia é contextual.


Michel Amaladoss é um jesuíta indiano. Diretor do Instituto para o Diálogo com Culturas e Religiões em Chennai. Professor no Vidyajyoti College of Theology, em Delhi. Autor de livros e artigos.

Esse texto faz parte do livro Teologia para Outro Mundo Possível, São Paulo, Ed. Paulinas, 2006, pp 373 a 391; organizado por Luiz Carlos Susin.

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