sábado, 10 de maio de 2008
Da Conversa
O que faz que tão poucos sejam agradáveis na conversa é que cada um pensa mais no que quer dizer no que os outros dizem. É necessário escutar aqueles que falam, se quisermos ser escutados; é necessário lhes deixar a liberdade de se fazerem ouvir e mesmo de dizerem coisas inúteis. Em vez de contradizê-los ou interrompê-los, como seguidamente fazemos, devemos, ao contrário, entrar em seu espírito e em seu gosto, mostrar que os ouvimos, falar-lhes do que os toca, elogiar o que dizem, se merecer ser elogiado, dar mostras de que é antes por escolha que por complacência que elogiamos. É necessário evitar contestar coisas indiferentes, raramente fazer perguntas inúteis, nunca deixar transparecer que pretendemos ter mais razão que os outros e ceder com elegância a vantagem da decisão.
Devemos dizer coisas naturais, fáceis e mais ou menos sérias, segundo o humor e a inclinação das pessoas com quem nos entretemos, não coagí-las a aprovar o que dizemos, nem mesmo a responder. Quando assim tivermos satisfeito os deveres da civilidade, podemos falar dos próprios sentimentos, sem prevenção e sem obstinação, deixando transparecer que procuramos apoiá-los na opinião daqueles que ouvem.
Deve-se evitar falar longamente de si mesmo e apresentar-se como exemplo com freqüência. Não se poderia ter demasiada aplicação em conhecer a inclinação e o alcance daqueles com quem se fala, para se juntar ao espírito daquele que o tem mais apurado e para somar os próprios pensamentos ao dele, fazendo-o acreditar, sempre que possível, que é dele que a gente os toma. É uma habilidade não esgotar os assuntos de que se trata e deixar sempre aos outros alguma coisa a pensar e a dizer.
Nunca se deve falar com ares de autoridade, nem se servir de palavras e termos maiores que as coisas. Pode-se manter as próprias opiniões, se forem razoáveis; mas, ao mantê-las, não se deve jamais ferir a opinião dos outros, nem parecer chocado com o que dizem. É perigoso querer dominar sempre a conversa e falar repetidas vezes da mesma coisa; deve-se participar indiferentemente de todos os assuntos agradáveis que se apresentam, sem nunca mostrar que se deseja levar a conversa para o que se tem vontade de dizer.
É necessário observar que toda espécie de conversa, por mais honesta e espiritual que seja, não é igualmente própria para toda espécie de pessoas honestas; é preciso escolher o que convém a cada uma e escolher até mesmo o momento de dizê-lo; mas, se há muita arte em falar, não há menos arte em se calar. Há um silêncio que é eloqüente: ele serve às vezes para aprovar e para condenar; há um silêncio zombeteiro; há um silêncio respeitoso; há ares, tiradas e maneiras que fazem com freqüência o que há de agradável ou de desagradável, de delicado ou de chocante na conversa. O segredo para bem empregá-los é dado a poucos; aqueles mesmos que estabelecem suas regras se equivocam às vezes; a mais segura, segundo meu parecer, é não ter nenhuma que não possa ser modificada, é antes apresentar negligência que afetação no que se diz, é escutar, quase não falar e nunca se forçar a falar.
La Rochefoucauld - Máximas e Reflexões
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